A
suposta rivalidade construída entre os Xokó e o Mocambo*
Percebi a importância da valorização da cultura indígena no
país e em especial em Sergipe e ainda quando se aproxima a comemoração do 19 de
abril, pela significante luta no território. Localizada na Ilha de São Pedro,
no município de Porto da Folha, nas margens do rio São Francisco, que conta sua
história desde o século 17, quando o donatário da mesma região doou aos índios
a extensão de uma “légua em quadro” por serviços guerreiros na luta contra os
holandeses. A comunidade Xokó difere da maioria das lutas no país por não
somente serem tirados de suas terras, mas por serem proibidos por muito tempo, de dizer quem eram, de
assumir sua identidade, de fazer seus ritos, de produzir cerâmica, de dançar o
toré... Os Xokó em Sergipe moravam nas redondezas da Ilha de São Pedro e foram
obrigados por fazendeiros da região a atravessar o rio e alojar-se somente na
ilha, região bem menor daquelas que eles viviam, que era composta pela Ilha
(97ha = hectares) e a região da Caiçara (4.220ha). Por volta da década de 70,
deu-se o embate com esses fazendeiros, onde houve derramamento de sangue, armas
foram expostas, até conseguirem chegar aos bancos dos tribunais de justiça,
onde conseguiram a tutela federal, acompanhado pela territorialização das
terras da Ilha de São Pedro e a Caiçara, e o mais importante, o direito de
assumirem sua verdadeira identidade, nos mostrando toda luta e conquista de um
povo guerreiro.
Vizinho a comunidade Xokó existe uma comunidade quilombola,
o Mocambo. O Mocambo como os Xokó também partiram para a luta, para a conquista
de seus direitos em Sergipe, sua luta é datada da década de 90 em que trouxe o
reconhecimento com remanescentes quilombola e a conquista da terra foi um
desses direitos conquistados.
Divididos por uma cerca de arrame, com fortes relações de
parentesco, a luta pela conquista da valorização de serem o que são, como a
luta pela terra, a discriminação, a perseguição, entre outros fatores, os une,
por terem uma luta parecida debaixo de um sol rachante.
Nós, detentores da sistematização dos valores científicos,
os acadêmicos, precisamos saber nos colocar em situações embaraçosas. Percebemos o avanço dos Xokó em detrimento
dos negros do Mocambo no que diz respeito à burocratização dos seus direitos,
por até constatar que, por diversas vezes o representante dos Xokó, Apolônio
Xokó, esteve em tantos lugares inicialmente a representar e defender os
direitos dos negros e negras do Mocambo, segundo o mesmo**. Assim venho frisar
o cuidado de se propagar a rivalidade e o conflito entre essas comunidades,
principalmente no meio acadêmico, e a ter a percepção que para diversos alunos
e alunas as palavras dos professores e professoras ainda constituem verdade
absoluta.
A possibilidade de vivenciar conteúdos na prática se faz de
uma experiência única, para qualquer etapa da vida acadêmica, mas o uso da
justificativa da rivalidade entre as comunidades para se explicar situações
embaraçosas, fica difícil a credibilidade enquanto informação científica. Conversando com alguns índios Xokó no ultimo
dia 15 desse mês e ano, eles me confirmaram sim a rivalidade dessas
comunidades, mas no que se tange dentro dos campos de futebol e somente lá,
mostrando ser pontual as pequenas intrigas. Com esse relato, deixo minha
indignação com relação a interferência da academia na construção de pseudo
valores que só fazem implodir as lutas, as conquistas de povos ancestrais no
território sergipano, que ainda se tem muito por conquistar e a se comemorar,
não se restringindo ao 19 de abril.
REFERENCIA BIBLIOGRÁFICAS
*Texto escrito pela graduanda em História Juliana de Almeida
Aguiar Silva. Email: juliana.almeidaaguiar@gmail.com
**Entrevista concedida por Apolônio Xokó em 15/04/2012 na
comunidade Xokó.
ARRUTI, José Maurício Paiva
Andion. Mocambo: antropologia e história do processo de formação quilombola.
Bauru, SP: EDUSC, 2006. 368 p.
DANTAS, Beatriz Góis. Xokó:
grupo indígena em Sergipe. Aracaju, SE: Secretaria de Estado da Educação do
Desporto e do Lazer, 997.. 45 p.